AUSÊNCIA DE PRESCRIÇÃO PARA OS DEFICIENTES MENTAIS – UMA CONSTRUÇÃO JURISPRUDENCIAL

A prescrição está prevista no artigo 189 do Código Civil e é conceituada como a extinção de uma pretensão, ou seja, da possibilidade de ingressar com uma ação pleiteando um direito que foi violado. Não se trata de extinção do direito em si, mas do que poderia ter sido pleiteado e não foi em razão do decurso de tempo.

Os prazos prescricionais estão descritos no ordenamento jurídico, em especial nas Leis e na Constituição Federal, e cada tipo de ação ou de violação a um direito tem um tempo distinto para ser requisitado.

Por exemplo, no direito previdenciário, a prescrição para percebimento de parcelas vencidas é de 05 (cinco) anos da data em que restou pleiteado o benefício. De igual modo, cita-se o direito do trabalho, cujas verbas que podem ser pleiteadas em uma ação dessa natureza, também abrangem o período de até 05 (cinco) anos anteriores a finalização do vínculo empregatício ou de trabalho, contados da data de propositura da demanda.

No entanto, o que é necessário destacar são as exceções para a contagem desse prazo.

Hoje, a única exceção prevista na legislação diz respeito aos menores de 16 (dezesseis) anos, que são absolutamente incapazes para exercer os atos da vida civil. Logo, a fluência do prazo prescricional para eles tem início a partir desse marco temporal.

Com a publicação do Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei nº 13.146/2015) fora revogado o dispositivo de lei que considerava como incapazes também as pessoas com deficiência psíquica ou intelectual e/ou acometidos por doenças mentais. Ou seja, aqueles indivíduos que não tem discernimento para prática dos atos da vida civil, ocasionadas por deficiência ou doença mental, deixaram de ser incapazes na legislação civil, e, consequentemente, passaram a ter a fluência da contagem do prazo prescricional da mesma forma que os demais.

No entanto, ainda que a lei disponha dessa maneira, há entendimento diferenciado na jurisprudência, que reconhece às pessoas com deficiência mental/intelectual, a ausência de contagem da prescrição, quando comprovada a falta de discernimento para pleitear os direitos que lhes foram violados e, logicamente, cujo prejuízo não lhes pode ser imputado.

Propriamente nesse sentido que Desembargador Federal Paulo Afonso Brum Vaz, do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, dispôs ao decidir sobre a ausência de prescrição em um processo judicial que buscava parcelas em atraso de benefício assistencial de prestação continuada – LOAS, por um período maior do que 05 (cinco) anos1.

No referido caso, foi reconhecido que não havia a incidência da prescrição para cobrança dos valores, por se tratar a parte autora de pessoa com deficiência, sem capacidade de discernimento para os atos da vida civil. Destacam-se os exatos termos da decisão: “Segundo meu entendimento, a vulnerabilidade do

indivíduo portador de deficiência psíquica ou intelectual não pode jamais ser desconsiderada pelo ordenamento jurídico, ou seja, o Direito não pode fechar os olhos à falta de determinação de alguns indivíduos e tratá-los como se tivessem plena capacidade de interagir em sociedade em condições de igualdade. (grifei).

Em outro trecho, o Desembargador assim destacou sobre as pessoas com semelhante estado: “Os portadores de enfermidade ou doença mental que não têm o necessário discernimento para a prática dos atos da vida civil persistem sendo considerados incapazes, sobretudo no que concerne à manutenção e indisponibilidade (imprescritibilidade) dos seus direitos”.

Logo, com vistas para esse entendimento jurisprudencial e pelos princípios norteadores do nosso ordenamento jurídico, para os deficientes, àqueles que pela sua condição, não possuem a capacidade para discernir ou tomar decisões, não há prescrição dos seus direitos, podendo pleiteá-los a qualquer tempo.

1 TRF4, AC 5005622-92.2021.4.04.7209, NONA TURMA, Relator PAULO AFONSO BRUM VAZ, juntado aos autos em 15/06/2023.

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